Wednesday, May 7, 2008
 
BALANÇO 2007 #2
MOMENTOS NEGATIVOS
• A ideia que Portugal está inevitavelmente encalhado na cauda da Europa. Diga-se de boa verdade que as últimas governações não têm facilitado o fim do pessimismo reinante. Será que o dinheiro na carteira do povo facilita a inversão das estatísticas? Humm! Um mistério para os políticos!
Já agora, repararam no regresso de Santana Lopes?!? É preciso lata!!
• A misantropia das majors que continua a não iluminar o caminho para o futuro ou o conformismo estático das editoras perante a revolução do mp3. Prince e Radiohead foram os mais recentes murros na barriga do moribundo.
• A saloiice intelectual dos governantes que exigem mais música portuguesa na rádio. As cotas poderão forçar as playlist's mas o público pode continuar a não gostar da péssima música que se produz em alguns quadrantes da nossa pop/rock. Para quando cotas mínimas para mais programas de música na TV?
• Rapto ou morte? Pais McCann: vítimas ou assassinos? O que é feito de Maddie? Devolvam Maddie! Um ano fabuloso para o jornal 24 Horas. Nunca se viu tanta especulação e palermice mediática num jornal só. Já agora um agradecimento às televisões que muito contribuíram para o aumento do entretenimento informativo. Bem dita hora que os McCann visitaram Portugal...
• Um insulto muito especial para o meu sócio que acertou nos 5 números do Euromilhões na semana em que não registou o boletim da sorte.

MOMENTOS POSITIVOS
• Para muitos o Dance Stacion pode não ter sido o mais interessante dos festivais de Verão mas o serão passado entre a estação do Rossio e o Coliseu dos Recreios marcou-me a memória. E acho que fiquei a dever dinheiro a alguém...
• A edição de Alive 2007 dos Daft Punk. Voltou-me à memória o espectáculo magnífico no Sudoeste do ano passado.
• Dr. House foi a grande descoberta do ano na TV. Referências elogiosas para outras grandes séries de televisão: Heroes, 24, Prison Break e já agora Betty Feia. Em Portugal nota positiva para os Gato Fedorento (a melhor sátira politica) e A Guerra (documentário de Joaquim Furtado sobre a Guerra Colonial).
• Destaque para uma série de grandes músicas que enriqueceram o panorama musical em 2007, eis algumas: Pinch “Brighter Day” (ft. Juakali), Bob Marley & The Wailers “Don’t Rock My Boat”(Stuhr Remix), Sharon Jones & Dap-Kings “01 100 Days, 100 Nights”, Christian Prommer “Strings Of Life”, Kanye West “Good Morning”, The Field “Mobilia”, Pantha Du Prince “Saturn Strobe”, The Midnight Juggernauts “Into The Galaxy”, Moodymann “Technologystolemyvinyle”, Hot 8 Brass Band "Sexual Healing", Bonde do Role "Gasolina" (Buraka Som Sistema Remix), Kode 9 "Magnetic City", entre outros que a memória atraiçoa.
• Grandes discos em 2007: o inevitável Untrue de Burial, Matthew Dear, M.I.A, Bjorn Torske, Nostalgia 77, Justice, Cobblestone Jazz, The Cinematic Orchestra, Boys Noize ou Ebb. Para o ano há mais.



BALANÇO 2007 #1
Num ano particularmente pouco inspirado, estes são alguns dos discos que mais sobressaíram. A escolha é pessoal e obedece a critérios subjectivos. Há quem concorde, e na mesma proporção, quem discorde.
Com o apanhado dos melhores discos (e daqui a poucos dias os Momentos e as Canções 2007), a missão por este ano fica concluída. 2008 está aí. Ano novo, vida nova, discos novos... e daqui a um ano listas novas.
Live, long and prosper.

1. Burial – Untrue
Poder-se-ia acreditar que depois de Burial (2006) que haveria pouca margem de manobra sonora para um segundo disco, especialmente preparado em tão pouco tempo. Mas resposta não tardou. Untrue mantém os princípios do disco inaugural (atmosferas densas e sombrias, fantasmas soul que vocalizam amarguras, geometrias 2-step exactas) sem que para isso se conclua que é mais do mesmo. Há elementos transgénicos que são subtilmente introduzidos na matriz. Burial baralha a tabela periódica com a preocupação de não desencadear reacções químicas explosivas. Trabalha obsessivamente na sua música madrugada fora. É perfeccionista quando tem noção que tem em mãos um som único não só reverênciado pelo público dubstep, como também por uma massa de gente que supostamente nem lhe deveria achar o mínimo de graça. Untrue é sem dúvida sombrio e fantasmagórico, mas também iluminado e transversal.

2. Nostalgia 77 - Everything Under the Sun
Entre o sentido urgente de regresso aos clássicos e a necessidade do exercício de libertação espiritual, o quadro aqui eloquentemente oferecido proporciona uma rara narrativa onde a liberdade toma as redias da acção dramática. Não se supõe as consequências para o futuro, apenas que ele ganhará com a magnífica interacção dos músicos falsamente convidados ou as vozes magistrais que enriquecem os conceitos do produtor. Lizzy Parks é prova evidente dessa ideia logo no início do disco (“Wildflower”) quando nos invade o espaço com uma promiscuidade vocal entre Carole King ou Ella Fitzgerald. Uma vez captada a atenção inicial e encontrado o desejo de descoberta, o resto sente-se enquanto a envolvência orquestral nos embala a alma e o ritmo nos massaja a acepção que temos da realidade.

3. Matthew Dear - Asa Breed
Do Michigan chega o perfeito exemplo da extraordinária capacidade de estruturar pequenas canções pop – algumas a sonhar com o Verão – e simultaneamente promover o lado mais hedonista da música. No início Dear propõe-se a desbravar os ideais tech-house que orientaram a música nos dois primeiros discos – especialmente Backstroke (2004) – para depois dedicar-se à eloquência de uma tech-folk camuflada, quente e inspirada. E à medida que caminhamos para o fim perdemos um pouco a noção do papel que o techno ou o house desempenham. Mas no gume entre a especulação da gramática pop, o experimentalismo high-tech – umas vezes iluminado, outras soturno – e o prazer de fazer boa música, encontra-se a mais-valia que realmente trás ao mundo um facto estético capaz de devolver clarividência à humanidade.

4. M.I.A. – Kala
A diversidade é uma das mais-valias de M.I.A. Kala representa a irreverência da sua autora, que não resiste às palavras fortes para transmitir mensagens politicas. Representa uma viagem que a levou aos quarto cantos do mundo (India, Trinidad, Jamaica, Austrália e Japão) numa demanda espiritual. Representa um lado selvagem e agressivo que ao mesmo tempo deseja veemente a glória e a vingança. É uma música irrequieta e festiva que não poupa nem no “cravo” nem na “ferradura”. Ou não fosse o ímpeto tribal Tamil uma marca no código genético de M.I.A. e simultaneamente um elemento fundamental na transformação de muitos dos elementos pop em lanças eficazes. Kala é uma das marcas de autor mais originais do ano.

5. Justice – †
† (Cross) é para muitos o mais pertinente registo a sair dos campos Elísios desde Homework. Antes mais recupera o espírito aventureiro e rebelde do disco de estreia dos Daft Punk. Depois devolve nesta década o charme do french-touch sem que realmente se preocupe com essa designação. † é festivo na mesma proporção que é inventivo na tentativa de construção de uma linguagem de autor. É electro, é funk, é house, é disco mas também uma simbólica ambição de ser um registo rock onde os sintetizadores substituem competentemente as guitarras. Será em última instância uma das poucas consequências positivas do malogrado electro-clash. Ou talvez não. Seja como for os Justice são os meninos bonitos da actual música francesa que uma vez mais se vê representada no mundo por dois jovens e ambiciosos produtores.

6. Cobblestone Jazz - 23 Seconds
Em 23 Seconds o efeito hipnótico das espirais caleidoscópicas reserva momentos raros de transe onde a condição humana não é substituída por infindáveis ligações mecânicas ou bites e bytes em excessos repetitivos. 23 Seconds é em muitos aspectos a evolução da consequência do encontro da matemática sonora dos Metamatics (no início), da experiência techno-jazz humana de Jonah Sharp no Spacetime Continuum de Emit Ecaps e da sabedoria geométrica da velha escola IDM. Ou seja, uma consequência natural da mutação da memória e da destreza de alguma inovação. Um momento inteligente e complexo que servirá competentemente quem procura soltar as amarguras na pista de dança ou opta pelo sofá para espantar os espíritos alienígenas.

7. Bjorn Torske - Feil Knapp
Os devaneios são saudáveis, charmosos e expressivos. A música evoca liberdade e uma melancolia sã, ela revela o tempo que calmamente levou a ser preparada – o último disco de Torske data de 2001. Tudo o que é exposto ouve-se num ápice como se se tratasse de uma música propositadamente light e de consumo instantâneo. A abrangência estilística é deleitante e eloquente, visivelmente resultante de uma inteligência que tem noções claras de como a operação em estúdio deve decorrer – e de como se devem atingir os objectivos. Bjørn Torske tem finalmente mérito próprio, soube decompor a matéria e teve tempo para a digerir. Transmite uma sensação de ingenuidade mas sabe bem que aí reside a mais-valia de um som que vê uma série de partículas assentarem no sítio certo. O espectro de Feil Knapp é integro e de muito bom gosto.

8. Kalabrese – Rumpelzirkus
Um sonho infantil pode abrir espaço a uma arena onde os sons vagueiam à sua vontade. Mas quando soa o apito final, todos esses sons sabem ocupar o lugar correcto no tempo e espaço. Rumpelzirkus não será certamente o facto estético pelo qual todos almejamos, mas a aparente inocência a que nos sujeitamos num disco – talvez excessivamente longo – que tanto alude à nostalgia dos tempos mais pop de uns Underworld, os dias mais carismáticos de Herbert ou à melancolia de David Sylvian e abraça simultaneamente, de forma coerente, a gramática da música destes últimos tempos, já serão motivos de sobra para escutar todos estes deliciosos malabarismos.

9. The Cinematic Orchestra – Ma Fleur
Ma Fleur marca a viragem do colectivo para outros quadrantes. A folk e a pop passam a fazer parte do léxico. A eloquência jazzistica mantêm-se, a humilde ambição de escrita para um filme também. O piano ganha visibilidade num sector folk, tal como a guitarra acústica. Os ambientes melancólicos sentem-se na pele. E as vozes de Patrick Watson ou da repetente Fontella Bass asseguram-se de que o arrepio é eficiente. Ma Fleur é um mimo intimista que muitos estranharão ao início, mas o tempo acabará por provar que a viragem talvez tenha sido a melhor opção num período menos feliz para o nu-jazz e cada vez mais favorável à nova folk.

10. Boys Noize – OiOiOi
Oi Oi Oi representa o segundo passo consistente na tentativa de redifinição do paradigma Homework vs Human After All – a seguir aos Justice, naturalmente – ou seja techno-house em colisão directa com uma atitude punk-rock. Por entre os exercícios robustos de regozijos ácidos, apresentam-se peças experimentais que procuram um espaço próprio no universo de Boys Noize. Um espaço relativamente indefinido, negro, duro, áspero, longe do electro/funk habitual e parcialmente oposto aos momentos mais festivos. Oi Oi Oi devolve o vigor, o som e o barulho que as colunas julgavam ter perdido quando se instalou a moda do minimal. É o regresso às pistas dança de uma energia destorcida, intrépida e contagiante.

11. Ebb – Loona
Não viveremos em Loona o absoluto reconhecimento de um novo mundo, agora já podemos viver na necessidade de descobrir, quanto antes, um disco pop que agradará a quem encontrou nos Junior Boys o ideal de canção perfeita. Frio por fora e quente por dentro, Loona reconforta-nos com a sua delicadeza natural, embala-nos a alma com a sua monção poética e derrete o gelo sem grandes contrariedades. Nem se esperaria mais em tempos de aquecimento global.

12. Common - Finding Forever
Entre a revolta interior, a alquimia que permite melancolia e a alegria, retratos urbanos, banalidades sociais e a necessidade da inspiração religiosa, Common volta a ser certeiro na proverbial expressão dos seus sentimentos. Uma vez mais Kanye West serve de base para uma produção imaculada, não muito aventureira mas proficiente o suficiente para que a alma se expresse com eficiência. “Start The Show” e “Forever Begins” são prova disso mesmo quando de uma forma quase sublime nos encantam com uma linguagem hip hop e soul muito acima da mediocridade que reina no meio. Talvez a própria distancia entre Detroit e Hollywood seja um factor essencial para que não haja contágios com o burlesco que a industria manipula.

13. Yestersday New Quintet - Yesterdays Universe
Yesterdays Universe
é um empilhamento sonoro impressionante, tanto nas referências - que podem ir de Sun Ra a Miles Davis, do samba ao blaxpoitation -, na forma como a produção sobrepõe sons de forma caótica mas que no fundo cria uma massa jazz robusta ou ainda nas diversas vertentes de um jazz inconformado que criam uma homogeneidade estética sem paralelo nos últimos tempos. É certamente um disco que não entra com facilidade, nem se sente de imediato. Mas depois de descoberto provoca arrepios na espinha e deglute-se com um prazer inestimável. E se não ignorarmos o facto de nada naquele grupo de pessoas criados por Otis Jackson Jr. ser verdadeiro, nada como nos sentir enganados de vez em quando para apreciar um projecto de fantasmas que "tocaram" até hoje a melhor música produzida por Madlib.

14. Solal - The Moonshine Sessions
As músicas de The Moonshine Sessions são no mínimo pequenas pérolas que representam a forma argilosa como Solal encara, abraça e adapta sem preconceitos a música country. The Moonshine Sessions é em espírito uma ode à musica popular tradicional norte americana com poucas, ou mesmo nenhumas, ligações ao panorama da actual musica popular produzida na Europa, muito menos – como os projectos anteriores – um entrelaçado de sons electrónicos. A elegância destas músicas distingue-se pela formalidade com que se apresentam ao mundo. E se na mente ecoam memórias de velhos titãs – Johnny Cash, Neil Young – em busca de novos acordes, não deixará de ser interessante, e mesmo pertinente, que Solal evoque a escrita clássica enquanto os novos talentos do country local esconjuram os princípios activos do blues e da melhor white soul music.

15. Juba Dance – Orange
Pelo tempo e espaço que proporciona a um conjunto de temas, distribui sabedoria na construção melódica quando integra o conhecimento de velhos mecanismos na base dos samplers e dos sintetizadores, na versatilidade dos instrumentos de sopro, na obsessão dramática das orquestrações ou na desenvoltura rítmica apropriada – com fundamentos no electro-funk old school ou nos beats nascidos nas ruas do Bronx – e simplifica o resultado final sem descrédito para nenhum dos ingredientes que compõem esta calda eloquente. Por isso Orange é mais uma das poucas provas que testemunham a qualidade da versatilidade do hip-hop em dias cinzentos e quadrados.



JUBA DANCE
Orange
A promiscuidade e a especulação são com frequência as armas essenciais na maquinação de um punhado de temas inspirados pelo gosto da aventura. E considerando-se de imediato que o presente ano não tem sido dos mais estimulantes no que diz respeito ao hip-hop, não deixará de ser pertinente que na recta final de 2007 surja com alguma espontaneidade o disco de estreia de um projecto denominado Juba Dance que, além da capacidade integrar no seu hip-hop transversal um sem número de tipologias, renova com gosto a sinceridade do debate sonoro em quadrantes perdidos no passado.
Apresentando-se com a maior descrição possível, como se de um qualquer desporto amador se tratasse, a dupla Benjamin Lamar – multi-instrumentalista de Chicago a residir no Rio de Janeiro – e Polyphonic The Verbose (aka Will Freyman) relembra com este disco a necessidade do hip-hop interagir culturalmente com outras linguagens que não só reforcem o carácter especulativo do género urbano, mas também aumentem a sensibilidade do verbo para novas semânticas sonoras – para além Gil Scott-Heron. Só assim poder-se-á entender a naturalidade da promiscuidade positiva de caixilhos sonoros que interligam a música do Brasil ("Tomorrow"), o velho blues ("Willow Blues"), o groove psicadélico ("Cachaca"), o jazz ("Message from Cham") ou os tons afro-cubanos ("Fisherman's Jig") numa única matriz que tem no hip-hop e no r&b os elementos unificadores e no dom da palavra a inteligência e a integridade.
Não será peça única nem uma das mais raras, mas Orange parte e reparte com instinto instigador o espírito e a memória como há muito não se ouvia. Pelo tempo e espaço que proporciona a um conjunto de temas, distribui sabedoria na construção melódica quando integra o conhecimento de velhos mecanismos na base dos samplers e dos sintetizadores, na versatilidade dos instrumentos de sopro, na obsessão dramática das orquestrações ou na desenvoltura rítmica apropriada – com fundamentos no electro-funk old school ou nos beats nascidos nas ruas do Bronx – e simplifica o resultado final sem descrédito para nenhum dos ingredientes que compõem esta calda eloquente. Por isso Orange é mais uma das poucas provas que testemunham a qualidade da versatilidade do hip-hop em dias cinzentos e quadrados.


DAFT PUNK
ALIVE 2007

Volvidos 10 anos sobre a edição de Homework – e não ignorando a sua influência permanete sobre a música pop –, os inúmeros projectos que hoje em dia recuperam as ideias fundamentais de um determinado french touch que os Daft Punk souberam usar em beneficio próprio – e também como forma de afirmação de uma linguagem electrónica que, especialmente na França, sofria da falta de estilização e de inúmeras oportunidades comerciais – são indicadores não só das qualidades da produção de Thomas Bangalter e Guy-Manuel Homem-Cristo, mas também da capacidade de entendimento e perverção das regras elementares do mercado.
Por terem sido adversos a actuações ao vivo durante um bom par de anos e aproveitando a comemoração de 10 anos de carreira (que a colectânea Musique Vol. 1 1993-2005 simbolizou), a dupla, que muitos condenavam ao obscuro fracasso, soube inverter as reacções negativas do pós-Human After All e desafiaram-se a si próprios com um projecto live multimédia faraónico sem precedentes. O Coachella de 2006 foi o primeiro palco a assistir a este novo conceito de espectacúlo. Essencialemte acente na “pirotecnia” tecnológica e um sem número luzes, projectores, LED e de LCD, os Daft Punk iluminaram de forma majestosa a música de Homework, Discovery e Human After All. Um espectáculo soberbo que entusiasmou (portugueses incluídos) e que ainda entusiasma milhares de espectadores que, independentemente do gosto pela música da dupla, rumam a festivais para se rendem incondicionalmente a tão singular espectáculo visual.
Para espanto de muitos, e ao contrário da linearidade a que muita das actuações ao vivo de projectos electrónicos obriga, a música live dos Daft Punk vivia, e vive também agora em formato físico, da aparente contradição das estruturas e texturas elementares de cada um dos três álbuns de originais. Ou seja, a dupla, num esforço positivo de refrescamento musical, decidiu o encadeamento de temas (êxitos e não êxitos) que aparentemente pouco tinham em comum, sobrepondo-os, remisturando-os e recontextualizando-os. Oiça-se, por exemplo, a miscelânea de "Around The World" e "Harder, Better, Faster, Stronger" ou "Television Rules The Nation" e "Crescendolls" (um dos melhores momentos) para perceber como dois temas de discos diferentes têm alguns pontos comuns e que juntos formam um tema renovado e enérgico.
Alive 2007, gravado em Paris com particular sentimento, é indiscutivelmente um ponto positivo que simbolizará mais uma vitória na carreira dos Daft Punk, não só porque representa mais uma fase de experimentação artística, como se torna num marco que recordará para sempre uma nova forma de actuação ao vivo. Pena continua a ser a ausência de um registo visual em DVD que permita à memória a nostalgia do que deverá ter sido uma noite única na vida de muitos festivaleiros. Da música já muito se disse e dos espectáculos já muito se escreveu. Os Daft Punk deverão agora começar a idealizar o futuro, porque Alive 2007 marca o fim de mais um passo na vida de Thomas Bangalter e Guy-Manuel Homem-Cristo. E mais cedo ou mais tarde espera-se vida nova.


COBBLESTONE JAZZ
23 SECONDS
Vivemos num mundo complexo, cheio de nuaces em constante mutação, formas que se metamorfoseiam em novos feitios ou conceitos que se multiplicam para além do horizonte do entendimento. A própria condição humana força a constante transfiguração como resposta alternativa à estagnação. Não será de menosprezar a imaginação como instrumento vital na catalisação do processo. Criar é a palavra de ordem desde que a humanidade sentiu necessidade de instrumentos para facilitar as tarefas do dia a dia. Assim foi e assim haverá de continuar a ser até que a tecnologia deixe de ser a aliada ideal do homem.
Não se estranhe a volatilidade com que tudo muda à nossa volta. As inconstantes na equação aumentam, as probabilidades, por vezes, pouco valem como estatística ou voltímetro das energias criativas. A moda ou a música são, enquanto artes, pólos que sofrem alterações, evoluções e reformas estruturais. Talvez a arte se reconsidere mais vezes que a ciência que, como resultado do pragmatismo, observa na lógica matemática a única certeza num universo ainda por explorar.
Em 23 segundos seria completamente impossível resumir qualquer percurso. Em 23 segundos não seria sequer viável a exposição conveniente e convincente de todas as transformações por que a humanidade passou, muito menos equacionável o compêndio da história. No entanto será possível que os mesmos 23 impossíveis segundos possam ser, no reino da imaginação, o tempo suficiente para os delírios inteligentes que empacotam a essência humana numa fracção, a improvisação no acto instantâneo da criação ou a sensibilidade no instante de uma sexagésima parte de um minuto.
Assim poder-se-á entender o sentido que os Cobblestone Jazz empregam na viagem inaugural onde tempo e espaço comungam em promiscuidade com a faculdade de programar enquanto procuram alguma complexidade no acto de improvisar. 23 Seconds fará as maravilhas de quem tem do techno minimal a única explicação para os longos delírios de 10 temas. A verdade poderá ser diferente se se procurar outro pilar que, mesmo admitido de que se trata de um techno despojado de artifícios, possa explicar a existência de singular registo – onde também convivem o dub e o breakbeat – num universo de música inteligentemente erguida a partir da arte de concepção e improvisação do jazz. Para que não haja dúvidas, não se trata de jazz, mas sim da capacidade de organizar os sons no tempo e no espaço como talvez o jazz faria.
23 Seconds provem do Canadá e expõe em duas faces Danuel Tate, Mathew Jonson e Tyger Dhula como elementos produtores de uma obra de estúdio que respira liberdade conceptual – onde outros do mesmo meio poluem com frivolidades inconsequentes e incompetentes – e como manipuladores de novos conceitos techno/jazz ao vivo (inspiração Bugge Wesseltoft?). Em 23 Seconds o efeito hipnótico das espirais caleidoscópicas reserva momentos raros de transe onde a condição humana não é substituída por infindáveis ligações mecânicas ou bites e bytes em excessos repetitivos. 23 Seconds é em muitos aspectos a evolução da consequência do encontro da matemática sonora dos Metamatics (no início), da experiência techno-jazz humana de Jonah Sharp no Spacetime Continuum de Emit Ecaps e da sabedoria geométrica da velha escola IDM. Ou seja, uma consequência natural da mutação da memória e da destreza de alguma inovação. Um momento inteligente e complexo que servirá competentemente quem procura soltar as amarguras na pista de dança ou opta pelo sofá para espantar os espíritos alienígenas. Excelente.


BURIAL
UNTRUE
Todos reconhecemos que o hype que se cria em torno de um músico ou produtor nada facilita o processo criativo do mesmo. Talvez por isso, a superação do registo debutante é frequentemente uma dificuldade nata que tem na pressão um inimigo que corrompe o esforço que procura novos horizontes. E admitia-se que, amiúde, na falta de melhor entendimento para a necessidade de um novo caminho se opte por um trilho paralelo que conduza a música para uma realidade alternativa mas sem rupturas substanciais com o passado. Talvez se entenda como uma continuação, uma fuga da arte para um terreno pantanoso que permite o reconhecimento natural de percursos anteriores enquanto o tempo prepara novos azimutes.
No caso de Burial seria de esperar uma curiosidade ampliada e um entusiasmo exagerado em torno de Untrue. Admita-se, também, que a tarefa de suceder o álbum homónimo editado no ano passado não era tarefa fácil para quem assumiu uma posição de ruptura evidente com o status quo da música de dança electrónica. O próprio Burial admitiu numa entrevista recente essa mesma dificuldade de superar o material que calmamente criara entre 2000 e 2005: ”I've just been trying to get back to why I wanted to make tunes in the first place. The first one got slightly out of where it belonged, and I found it a bit difficult to just block things out and make tunes in a low key way again…”
Então como poderá ser encarado este segundo capitulo na vida de Burial? Com naturalidade ou com desconfiança? Cada cabeça será livre de procurar o significado para as novas ideias da forma mais conveniente já que Untrue permite varias leituras que vão desde o aproveitamento dos pressupostos iniciados em Burial à paralisia do verdadeiro seguimento dos primeiros trabalhos. Em análise profunda, e diga-se de boa verdade, Untrue não provoca o mesmo choque que o seu antecessor. Nem seria de esperar que a ruptura fosse muito evidente em tão pouco tempo. Untrue não difere substancialmente no conteúdo e na forma, antes procura aperfeiçoar as técnicas de produção com rebordos vocais mais luminosos e geometrias 2-Step mais evidentes. E nada disso soará mal nesta música que se mantém desusada no escalão do dub e repleta de marcas únicas de autor.
Com experiência adquirida, Burial produz um disco conceptual que simultaneamente procura pensar o futuro sem ignorar a matéria-prima que levou a sua música a ser elogiada por diversos quadrantes. O tom melancólico subsiste, mas sem repetições: as vozes soul, soberbas, deslizam tristemente pelo tempo num lamurio que adquire novas dimensões, as melodias reluzem uma beleza pós-apocaliptica e angustiada, os estalidos do vinil preenchem o espaço com inquietação, os baixos informes rugem com invulgar força vulcânica e as texturas rítmicas, longe dos paradigmas do dubstep, invocam o falso prazer físico e hedionista da pista de dança.
Com Untrue, Burial devolve com eloquência, e num tom ainda mais sedutor, a essência que nos apresentou há um ano e explora com entusiasmo o que a noite obscura e claustrofóbica de Burial não permitia de livre vontade. Ou seja, e procurando uma metáfora que ilustre todo o quadro criativo, se o disco de apresentação representava o universo urbano escuro, soturno e sem esperança, Untrue exibe os primeiros tons da alvorada - numa lenta fuga ao fusco fantasmagórico -, recupera os primeiros sentidos depois da ressaca rave e restitui a confiança num futuro que se julgava perdido no cataclismo inevitável. Nesse prisma a capa não deixará de fazer perfeito sentido quando sugere alguma bonança na breve pausa para um café de um vulto mergulhado no desgosto. E se extrairmos prazer "religioso" dessa imagem pesarosa, não será vergonhoso admitir que Burial produz mais um disco sumptuoso, não obstante a bem aventurada e vaidosa redundância que aqui tem todos os motivos para continuar a existir.


Neil Landstrumm
Restaurant Of Assassins

Para começar teremos de imaginar Benga, Skream, Leofah ou os Digital Mistikz na mesma caixa de ritmos que Altern 8, Shut Up And Dance ou Aphex Twin. Depois, para que tudo faça o mínimo sentido, abrir a mente a uma das mais complexas experiências electrónicas do ano, para no fim inalar a liberdade conceptual que Restaurant Of Assassins força no sistema respiratório. Talvez assim se comece a discernir a lógica do caos que Neil Landstrumm lança na vertigem entre o mundo da nano-tecnologia e a realidade virtual.
Restaurant Of Assassins é simultaneamente uma obra espantosa e complexa. Ou espantosamente complexa. É difícil ignorar uma das mais sombrias experiências do ano que, além de devolver a substância que alimentou as raves na era hardcore-techno, devolve a especulação às linguagens mais ambíguas da electrónica actual e, na simultaneidade com que regenera o equipamento tecnológico que gera o dubstep no vácuo, dobra as barreiras sonoras com impressionantes doses de bass distorcido pelo calor ou suga os baixos subsónicos para o vazio do espaço.
Com o desenrolar do tempo junta-se alguma perplexidade pela invulgar estética que aqui ineloquentemente desfila. Do interior do núcleo celular deste corpo híbrido e alienígena, implode um conjunto maquiavélico de partículas sonoras díscolas e aparentemente desorganizadas, em que a lógica poderá não ser a melhor expressão que designe Restaurant Of Assassins ou a mais indicada para entender o que leva tão impertinentes factos a conviverem com a necessidade de confusão, muitas vezes no mesmo tempo e no mesmo espaço. Diria que nesse caos reside o principal problema que não eleva este disco ao estatuto de facto estético. A precoce verborreia sonora resvala amiúde para a desconexão melódica e estrutural, fórmula quimica que os Altern 8 dominavam com perfeição.
As ideias validas de Rockers "The Underground King", Give Me Fire ou Bleep Biopsy contrapõem-se com a falta de delicadeza estética com que muitos dos temas se apresentam. Restaurant Of Assassins não deixará de ser um dos mais impressionantes corpos extraterrestres que aterraram neste terceiro calhau a contar do sol, mas alguma irracionalidade na distribuição das diversas energias deixa sobretudo perturbação e tumulto nas mentes que ouvem tamanha bizarria techno. No entanto a liberdade conceptual que o conjunto provoca não deixa de ser entusiasmante, isto se atendermos ao facto de muita electrónica actual padecer de um excesso de confiança na programação mais elementar. Talvez por esse motivo alguma mudança, por mais complexa, sombria, confusa e improvável que seja, é sempre bem vinda.


UNDERWORLD
OBLIVION WITH BELLS

A história não perdoa. Se nada faria supor o sucesso de Born Slippy/NUXX, nada faria querer que um tema pudesse ser tão ruinoso para um projecto que não ambicionava o estrelato do dia para noite. Um projecto com consciência da sua existência no universo, na sua essência, com capacidade de utilizar a matéria cósmica na busca profícua da luz num qualquer buraco do espaço. Um projecto que viu estilhaçado, por vontade própria, uma filosofia musical com potencial grandioso.
A intensidade de Dubnobasswithmyheadman (1994) semeava à sua passagem momentos voluptuosos onde a consciência bucólica encontrava o degrau para as imaginações épicas do sonho urbano. Sonho interrompido pela eficácia de um remistura que criou pólos magnéticos excessivos e que terá deixado a bússola de Karl Hyde, Rick Smith e Darren Emerson num frenético rodopio e sem azimute determinado.
O nervo conceptual e a mesma inspiração que tecera obras inesquecíveis como Sky Scraper, Dirty Epic ou Cowgirl, anos antes, diluía-se numa promiscuidade rítmica excessivamente hedeonista, distante do niilismo que Dubnobasswithmyheadman por vezes evocava. E embora nunca tenham produzido um mau disco, os dias de A Hundred Days Off (2002) acabaram por ser os momentos em que as almas de Rez tomaram consciência da ausência de estratégia para além das actuações ao vivo. Ausência essa que acabou por lançar a banda para um impasse que acabaria por se agudizar com a saída de Darren Emerson que, anos antes, dera novo e importante fôlego para a criação do sumptuoso Dubnobasswithmyheadman.
Agora em 2007, e aparentemente recuperados, Karl Hyde e Rick Smith aspiram à conciliação com o passado distante ou, num nível espiritual, com o possível desejo que deixaram escapar por entre os dedos da mão. Oblivion With Bells não é Dubnobasswithmyheadman, mas talvez seja o mais parecido no ângulo da concepção, na elaboração pragmática da sua sonoridade tipicamente densa, obscura e melancólica - com inspirações entre Eno, Nick Drake ou Can - ou na perseguição fugaz da gramática pop ou da semântica rock ou até mesmo na concepção gráfica da capa. É uma fórmula - com algumas sofisticações de Beaucoup Fish(1999) - que não deixará ninguém boquiaberto ou desejoso de exageradas audições. Nada como algumas escutas merecidas para que se redescubra a eloquência da construção épica que só mesmo o techno inexacto dos Underworld sabe gerar. Um regresso saudável aos dias da génese ou o fim declarado da resaca? O futuro dirá.
 
Sunday, December 30, 2007
 
Electrónica alemã: a actualização possivel em 2007

Há muito que a Alemanha é um dos epicentros criativos mais activos da música electrónica. Apesar de ter contemplado a (r)evolução da cena rave na Inglaterra e o nascimento do french-touch, nunca deixou de ser um pólo criativo único, possuidor de uma linguagem própria – nomeadamente o trance – capaz de disputar os meandros da house com os mestres de Chicago ou reconfigurar as linguagens dos padrinhos do techno de Detroit. Talvez por uma questão de identidade nacional, os alemães nunca deixaram de evocar os Kraftwerk como os pais de uma linguagem electrónica de caris experimental, onde se liam nas entrelinhas os princípios básicos de uma revolução popular prestes a acontecer – e que deixaram muitos ouvidos de prevenção nos finais de 70.

Durante muito tempo a Alemanha foi palco de projectos mediáticos e medíocres que podiam ir de um house trampolineiro e colorido a um horrendo techno carrinho-de-choque. Exceptuando nomes de uma vaga trance emergente (no início dos anos 90) – Jam & Spoon, Alter Ego, Sven Vath, Hardfloor ou Resistance D – pouco mais se podia encontrar à superfície que pudesse convencer quem, com dificuldade, tentava aceder ao material mais underground, centro por excelência onde, ainda hoje, os movimentos nascem e se desenvolvem. E se depressa o trance se massificou à escala global, resvalando para uma epidemia duradoura e sem precedentes, a hora de desenvolver alternativas obrigou muitos académicos alemães a explorar as teorias do minimalismo que entretanto despontavam nos laboratórios da Minus de Richie Hawtin.

A relativamente discreta Basic Channel em Berlim tornou-se num ponto de atracção que foi cativando almas para um techno despojado. Um techno longe dos artifícios electrónicos que tanto caracterizaram as linguagens maximalistas, barulhentas e electrizantes das raves pós acid-house. Seguiram-se em Colónia a Kompakt, onde a tendência cada vez maior para o minimalismo dava a conhecer novos talentos como Wolfgang Voigt, Michael Mayer ou Superpitcher, e a Traum Schallplatten de Riley Reinhold; não ignorando, naturalmente, gente como Thomas Brinkmann ou Ricardo Villalobos, ambos produtores errantes que dividiam a sua vida entre Colónia e Frankfurt, onde também ficaram conhecidos pelos discos editados através da Perlon – relembre-se a série Superlongevity que muito contribuiu para a massificação e uniformização do minimalismo.

Mas a Alemanha não é só sinónimo de techno minimal. Um sem número de projectos editoriais desenvolveram sonoridades nos finais da última década que tanto podiam ir das electrónicas com inspiração jazz/ soul (Compost Records e Sonar Kollektiv) às atitudes rebeldes electro/punk com sabor a anos 80 (International DeeJay Gigolo Records) ou as electrónicas variadas e experimentais como no caso da Morr Music ou a irreverente BPitch Control de Ellen Allien – que desde o momento da afirmação no mercado, tem contrariado o techno esquelético de Colónia apresentado algumas alternativas viáveis para um cenário pós-minimal.

Como o mundo gira sem parar, não era de estranhar uma nova mudança de feitios e caracteres. No início do ano Pantha Du Prince não foi capaz, apesar de um disco muito interessante, de inverter alguma da lógica redundante que marcou o minimalismo nestes últimos anos. Os Digitalism por sua vez não convenceram com a dualidade Daft Punk vs electro-pop de 80 e ficaram-se por uma indefinição estética incapaz de criar uma identidade própria. Mas agora a situação é ligeiramente diferente.

Da Alemanha acabam de chegar três registos bem distintos que vêm provar que o techno minimal pode estar finalmente numa necessária recessão. Três discos que apresentam três ideias que engrossam a música electrónica e orientam as pistas para futuros caminhos: sejam eles uma ideia de regresso ao maximalismo (que encheu de vida as raves de início de 90), à exploração da plasticidade techno-pop em contextos abstractos ou as tentativas de invenção através da reinvenção dos métodos laboratoriais da composição IDM. Boys Noize, Supermayer e Modeselektor: três nomes e três ideias que confirmam um novo investimento sonoro numa nova direcção. O primeiro nome vem de Berlim e lança-se agora na aventura dos discos de longa duração, o segundo é um pseudo-super-grupo que nos traz dois senhores que estiveram envolvidos profundamente na cena minimal de Colónia e os terceiros, também de Berlim, procuram à segunda o reconhecimento negado à primeira. Novos ventos sopram, finalmente. Será para durar?

Boys Noize
Oi Oi Oi

Uma vez mais os Daft Punk andam nas bocas do mundo. Não porque tenham editado material recentemente, ou que a notícia de um novo álbum ao vivo tenha deixado as massas em delírio, mas porque 2007 é o ano em todos acordaram e redescobriram as virtudes de Homework, pegaram nos despojos do electroclash ou do rock e tentam reinventar o paradigma que deu aos franceses a fama de inovadores destemidos. Depois do excelente Cross dos Justice, do modesto Digitalism, de uns pobres Simian Mobile Disco, chega o projecto do alemão Alex Ridha: Boys Noize (projecto que de colectivo de rapazes tem muito pouco).
Oi Oi Oi representa o segundo passo consistente na tentativa de redifinição do paradigma Homework vs Human After All – a seguir aos Justice, naturalmente – ou seja techno-house em colisão directa com uma atitude punk-rock. Por entre os exercícios robustos de regozijos ácidos, apresentam-se peças experimentais que procuram um espaço próprio no universo de Boys Noize. Um espaço relativamente indefinido, negro, duro, áspero, longe do electro/funk habitual e parcialmente oposto aos momentos mais festivos. Oi Oi Oi devolve o vigor, o som e o barulho que as colunas julgavam ter perdido quando se instalou a moda do minimal. É o regresso às pistas dança de uma energia destorcida, intrépida e contagiante.

Supermayer
Save The World

O risco devia fazer parte significativa do jogo. Talvez por isso este é momento mais fraco deste pacote: Save The World da dupla Michael Mayer e Aksel Schaufler (a.k.a. Superpitcher), os Supermayer. Não terá sido por falta de vontade ou iniciativa. Quando o objectivo é a aventura por novos caminhos, o resultado pode acidentalmente resvalar para uma inocência que no fim não beneficia o resultado final. Save The World padece de uma ingenuidade que, não desvalorizando o esforço dos seus autores, assemelha-se a uma fuga precipitada do techno minimal para uma techno pop abstracta e ainda instável – com fugas ocasionais para o funk, o house e a péssima pop ambiental – que tarda em afirmar-se por ideias mais empreendedoras (Asa Breed de Matthew Dear é a excelente excepção).
Save The World não salva o mundo – por pouco não se salvava a si próprio – mas a vontade da dupla em fazer vingar um conjunto razoável de quadradinhos de banda-desenhada sonora, faz com que os momentos de prazer sejam reais e por vezes iluminados. O fim do mundo não se aproxima, mas é bom observar nomes ligados ao techno minimal em busca de novas paragens sonoras.

Modeselektor
Happy Birthday!
Não será fácil a catalogação desta música, muito menos será um trabalho inteligível encontrar as referências que movem estes invulgares produtores alemães. Não o era com Hello Mom! e muito menos será possível com o novo Happy Birthday!. Entre a lógica profícua adquirida pelo conhecimento do mecanismo do breakbeat, o rigor geométrico da house, os desejos imediatos de um hip-hop cibernético, o dubstep aberto a estímulos exteriores, o dub em causa electro e as memórias da electrónica artificial inteligence da Warp de outros tempos, Gernot Bronsert e Sebastian Szary apresentam-se à segunda com a mesma energia, a mesma consistência estética e o mesmo pensamento desusado e aventureiro que os caracterizou no álbum de estreia.
As tipologias que aqui encontramos não foram inventadas hoje, mas a perspicácia de as trabalhar de forma muito pessoal recupera uma visão, não nostálgica, mas uma que nos leva a acreditar que há cada vez mais adeptos do espírito libertino que caracterizou a alvorada das raves (oiça-se "Hyper, Hyper" para perceber), sem problemas de assumir uma escola que marcou uma revolução ou de nos devolver um estilo de programação que se pensava perdido no reino da indolência. E não fosse um disco excessivamente longo, Happy Birthday! seria certamente um disco único em 2007. Nada que não prejudique significativamente a inventividade de algumas peças bem pertinentes.
Publicado originalmente no Bodyspace


I2I
O Tempo Está a Acabar

No momento em que a trajectória da premissa original dos I2I foi alterada, nada voltou a ser o mesmo. E se podemos afirmar que a mudança de curso não foi totalmente perniciosa, não deixará de ser pertinente referir que há música que nasceu para não ter palavras. A desconfiança que ainda existe entre nós em torno de temas hip-hop instrumentais impede a reverência da experiência e afasta algum pretensiosismo estético, que até seria desejavel. Em Portugal, com honrosas excepções de Sam The Kid ou Rocky Marciano, poucos têm investido nesse tipo específico de produção com receio de passarem despercebidos ou de serem incapazes de elaborar um punhado de temas com o mínimo de narrativa sonora.
Os I2I iam no caminho certo. A componente instrumental d' O Tempo Está a Acabar não sofre das limitações mecânicas que outros produtores demonstram na arte da construção dos beats e na criação de envolvências melódicas; aliás Michelangelo e K manifestam um sentido estético correctamente defendido e elaboram um conjunto competente de quadros sonoros apocalípticos que, tendo o trip-hop experimental e soturno como entusiasmante ponto de partida, encontram nos Sofa Surfers de Encounters a verdadeira inspiração. Mas se os austríacos tinham consciência que o quadro apocalíptico sonoro que dominavam ajustava-se à mensagem politica pós-milénio, I2I revelam deficiências na integração dos seus convidados e permitem que as palavras inócuas arruínem os reais propósitos da operação.
Não deixa de haver momentos entusiasmantes em que um conjunto de vozes sem corpo dão a forma desejada à perturbante estrutura que sustenta as ideias maquiavélicas da dupla, mas na grande maioria das vezes os convidados – Regula, Criatura, Fuse, Tekilla e Chullage – distinguem-se por verbalizarem uma escrita pobre, atafulhada e sem grande dignidade, onde o tempo e espaço raramente são respeitados. Para os convidados o ambiente não deixa de ser distante e alienígena, talvez por isso a adaptação a esta sonoridade seja difícil para todos e crítica para os objectivos de Michelangelo e K, que ambicionando uma maior exposição mediática ou uma desneceessária vassalagem ao rap, perverteram lógica da operação e atiraram ao fogo a oportunidade de deixar o seu marco na produção nacional. O que não deixa de ser uma pena.


Kanye West
Graduation

A guerra de vendas entre Kanye West e 50 Cent pouco ou nada acrescentará à história da música deste ano. Nem a eventualidade de uma disputa incentivou os neurónios de ambos para a criatividade pura. Perante os novos registos pouco haverá de pertinente para dizer tanto sobre Graduation ou Curtis. No caso de Kanye West, o rapper de Chicago parece – pela sugestão do título – estar a terminar um ciclo. E enquanto o seu ego e arrogância aumentam e o seu estatuto como supra-sumo do hip-hop norte-americano se eleva mais um nível, a música – que é o que realmente conta – vai lentamente perdendo algum fulgor criativo ou algum sentido lúdico.
Kanye West é um produtor activo. Normalmente não padece da vulgar atrofia que assola muitos dos que fazem do hip-hop ou do r&b a sua vida. Assume-se, orgulhosamente, como um indivíduo que sabe escolher com quem trabalha e que com naturalidade sabe que o segredo para um bom tema nem sempre reside num beat simplista ou numa rima brejeira. O sampler tem sido fundamental como ferramenta de trabalho. Com ele tem esquartejado trechos fantasmas da soul dos anos 60 e eloquentemente organizado uma base onde a força da palavra tem ganho sentido analítico. As orquestrações – umas mais verdadeiras que outras – terão certamente um contributo no ambiente pretendido mas é verdadeiramente na conjunção beat/sampler que encontramos a mola oculta da construção melódica.
Graduation, para que fique bem claro, não é um disco de ruptura. Soa a um fim de cíclo escolar, como se a aprendizagem tivesse chegado a uma conclusão. É um registo hip-hop elegante com muitos pontos de contacto com os dois primeiros álbuns – talvez mais com Late Registration de 2005. A textura rítmica não varia muito, a promiscuidade com a pop mantém-se, as vozes soul de 60 – em tom estrumpfe – marcam a presença habitual e a verbosidade de Kanye confirma-o uma vez mais como um dos mais competentes MC da década. De resto pouco foi acrescentado à fórmula elementar deste hip-hop arraçado de r&b a não ser alguns elementos electrónicos que facilmente reconhecemos de alguma house europeia – nomeadamente os Daft Punk. Resumindo: Graduation soa a pouco, mas não soa tão mal como Curtis do frustrado 50 Cent.


Yesterdays New Quintet
Yesterdays Universe

Vindo de Madlib não será de estranhar que tudo não passa de um logro honesto. Nem será um ultraje acreditar que a forma nada convencional de trabalhar, traga ao mundo um facto que poderá alterar a perspectiva que temos sobre formas de produção. Ou sequer acreditarmos que um disco hip-hop não se assuma como tal e que o jazz seja a ferramenta mais utilizada para construir um disco que também não é jazz perante um grupo restrito de puritanos do free-jazz. Mas por estas linhas se cozem as ideias que constituem o quinteto virtual de um dos mais proeminentes produtores alternativos do hip-hop norte-americano: o Yesterdays New Quintet.
É bom lembrar que Madlib é imparável e que a sua linha de montagem já produziu alguns dos mais impressionantes discos da década. Desde Shades Of Blue a Angles Without Edges ou de Sound Directions: The Funky Side of Life a Madvillainy, passando por um quase sem número de projectos paralelos na Stones Throw e produções para terceiros, Madlib não se tem restringido ao hip-hop como o entendemos na sua forma mais convencional, tem também procurado renovar a linguagem do jazz com recurso à mesa de mistura e ao sampler, que normalmente são instrumentos primários na actividade de um DJ. Instigando não só a produção própria como Madlib, Quasimoto ou Madvillan ou o caso do primeiro disco de Y.N.Q. ou aproveitando o interesse da Blue Note para uma série de reconstruções que fizeram de Shades Of Blue um clássico instantâneo, Otis Jackson Jr. é literalmente o homem dos sete instrumentos dos nossos tempos: tem visão clara do futuro em vez de uma clarividência enevoada, tem marca criativa que o torna num autor autêntico, produz a um ritmo alucinante sem nunca a sua música resvalar para o desinteressante e tem conhecimentos musicais transmitidos pela família - ou adquiridos de forma autodidáctica - que o inspiram no quotidiano.
Neste novo disco do Yesterdays New Quintet o conceito não se fica pela exposição de mais uma série de temas tocados enquanto “colectivo”. É o próprio universo do projecto que é posto à prova: cada "elemento" deste quinteto virtual é incentivado a criar tendo por base as suas referências musicais. Yesterdays Universe é no fundo uma súmula dos estilos dos seus elementos, uma antologia que retrata a visão única dos supostos músicos que constituem um projecto que na verdade se resume a uma pessoa. E se The Last Electro-Acoustic Space Jazz Ensemble, Kamala Walker & The Soul Tribe, Monk Hughes & The Outer Realm, Young Jazz Rebels, Jackson Conti, The Jazzistics, Malik Flavors ou Ahmad Miller não passam de nomes fictícios, já cada um desses mesmos nomes terão uma ligação pessoal a Madlib; possivelmente facetas diversas de um músico que combate diariamente pelo controle de todos os elementos criativos na sua alma.
Tal como Angles Without Edges de 2004, este novo Yesterdays Universe é um empilhamento sonoro impressionante, tanto nas referências - que podem ir de Sun Ra a Miles Davis, do samba ao blaxpoitation -, na forma como a produção sobrepõe sons de forma caótica mas que no fundo cria uma massa jazz robusta ou ainda nas diversas vertentes de um jazz inconformado que criam uma homogeneidade estética sem paralelo nos últimos tempos. É certamente um disco que não entra com facilidade, nem se sente de imediato. Mas depois de descoberto provoca arrepios na espinha e deglute-se com um prazer inestimável. E se não ignorarmos o facto de nada naquele grupo de pessoas criados por Otis Jackson Jr. ser verdadeiro, nada como nos sentir enganados de vez em quando para apreciar um projecto de fantasmas que "tocaram" até hoje a melhor música produzida por Madlib.


M.I.A.
KALA

A jovem Maya Arulpragasam têm se divertido com o sucesso: From Day One, this has been a mad, crazy thing: I say the things I'm not supposed to say, I look wrong, my music doesn't sound comfortable for any radio stations or genres, people are having issues with my videos when they're not rude or explicit or crazy controversial. I find it all really funny. Não se estranhe o divertimento quando existe por entre uma postura provocatória um lado mais inocente que a leva a acreditar que as posições que toma são meras opiniões casuais e não posições politicas próprias. Se Maya não tivesse consciência do mundo em que vivemos até poderíamos acreditar que toda a controvérsia acontece por acaso, mas a verdade é bem mais linear: M.I.A. têm uma mensagem firme que objecta a hipocrisia ocidental em relação aos chamados países do terceiro mundo.
Desde as polémicas com um clipe na MTV – com um apoio explicito à libertação da Palestina – à recusa de entrada em território norte-americano por parte das autoridades de imigração, M.I.A tem se sujeitado a uma certa desconfiança que cresceu tanto em torno da mensagem emanada bem como da postura que tem assumido em público. E se as suas origens familiares a habituaram a perseguições politicas, a sua personalidade segue determinados princípios por respeito ao legado deixado pelo pai – M.I.A. refere-se especificamente à situação missing in action de seu pai – e assume-se como contestaria de um sistema corrompido pelo dinheiro.
Depois de uma estreia auspiciosa em 2005, Maya lançou-se em viagens sucessivas. India, Trinidad, Jamaica, Australia e Japão foram algumas das paragens que viriam a inspirar um novo testamento. Uma nova missiva que, não deixando cair a atitude proverbial de Arular, viria reforçar não só a sua imagem rebelde, bem como aprofundar os propósitos que deram a conhecer ao mundo uma das poucas jovens com princípios politicos definidos. Kala é, agora, esse tão aguardado recado ao mundo: um manifesto que tanto se disponibiliza a dar no "cravo" como na "ferradura".
Uma vez mais a voz peculiar de M.I.A. não vem ao mundo despojada de ritmos robustos. Com a colaboração de The Wilcannia Mob, Diplo, Blaqstarr, Timbaland e especialmente do produtor Switch, a jovem britânica de origens Tamil, não esconde a África como ponto de referência geográfica de uma sonoridade cada vez mais ambiciosa, mas também mais abrangente: o dub da Jamaica ganha protagonismo, o grime reflecte a angústia dos guetos suburbanos de Londres, o samba movimenta-se dissimuladamente, o disco-house quase "pimba" distrai a humanidade para acepções hedonistas, a música do mundo – em especial as texturas indianas – expõe um conhecimento que vai para além dos monumentos mais emblemáticos. Mas é em África que Maya se movimenta com naturalidade. É no continente negro que encontra a inspiração selvagem e que se sente com profunda apetência para berrar ao mundo com sentido oportunista.
Kala deseja veemente glória, tem sede de vingança, é como um animal em fuga do cativeiro que corre pelo mato não em busca de um novo dono mas em busca de uma nova sensação de liberdade. "Hussel", "Birdflu", "World Out" e "Boyz" são sem dúvida momentos perfeitos que reflectem essa ideia de um bicho em livre arbítrio após o cativeiro. "Bamboo Banga" e "Jimmy" já aproveitam para diversificar a paisagem com tons exóticos indianos. O bravio "Mango Pickle Down River" reverencia o hip-hop claustrofóbico com um sopro didgeridoo australiano em espirais hipnóticas. O resto do disco, talvez mais domesticado, aproveita para reservar espaço a uma sonoridade com um apelo pop que tanto permite a presença de Timbaland em "Come Around", como o gangsta-pop provocante de "Paper Planes". Tudo em bom-tom, mas longe de banalidades.
Aliás essa é uma das qualidades de Kala. Para além da diversidade estilística, todos os temas vivem de um equilíbrio entre o lado mais selvagem dos ritmos e as texturas mais ambíguas de uma electrónica em estado experimental. Mais-valia equacionadas num joguete onde M.I.A. tenta inteligentemente virar o rato contra o gato. Estratégia essencial no mundo em que vivemos, isto se pretendemos uma alternativa ao status quo em que a humanidade vive encalhada e do qual ainda não se preocupou em libertar.

Bjørn Torske
Feil Knapp

Uma vez mais o norte da Europa. Especificamente a Noruega como ponto central no velho continente onde o frio provoca convoluções na electrónica e a transforma numa manta onde diversas tipologias são retratadas e elaboradas em ponto de ebulição. O resultado não será mais que uma mescla quente que evoca um certo prazer sem ser excessivamente hedionista, que devolve o verdadeiro sentido da especulação à arte e ainda sente a necessidade de expor uma visão singular sobre a matéria-prima, implodindo-a a partir do seu núcleo. O resultado é quase um espectáculo de partículas que se espalham pelo tempo e espaço. Um espectáculo visual que entusiasma quem com regularidade vai tomando conhecimento do melhor que se vai produzindo nesta área.
Lindstrom, Prins Thomas, Todd Terje e uma vez mais Bjørn Torske são alguns dos nomes noruegueses ligados à música electrónica que rejeitam as conjecturas da indústria e constroem retratos sonoros invulgares sem num único momento criarem corpos estranhos e irreconhecíveis. Ou seja, lidam de forma pragmática com a arte, não rejeitam as tipologias mas conseguem devolver alguma ingenuidade à música que aprenderam a gostar na adolescência. A obsessão pelo disco-sound é prova evidente dessa ideia: institui-se um paradigma e lentamente ele vai sendo decomposto e digerido pela especulação inocente a que todo o artista devia ter direito por mérito próprio.
Não sendo muito preciso colocar Torske na mesma bagageira de Lindstrom ou Prins Thomas, e apesar de existirem neste Feil Knapp pequenos pontos de contacto – "Hatten Passer" e "God Kveld" –, a obsessão de Torske neste novo disco é o dub e não tanto o disco-sound. É na Jamaica que o autor encontra a fonte de inspiração, é de lá que é reconhecemos a capacidade de erguer texturas melódicas que vão ecoando pelo tempo. Nem sempre identificamos o dub de forma óbvia, como em "Spelunker" – primoroso Spektrum 128K vs Augusto Pablo – ou "Kapteinens Skjegg", amíude ele camufla-se por entre o disco, o house baleárico ("Loe Bar") e outras precursões com origens pouco consensuais – "Tur I Maskinparken" ou "Møljekalas".
Os devaneios são saudáveis, charmosos e expressivos. A música evoca liberdade e uma melancolia sã, ela revela o tempo que calmamente levou a ser preparada – o último disco de Torske data de 2001. Tudo o que é exposto ouve-se num ápice como se se tratasse de uma música propositadamente light e de consumo instantâneo. A abrangência estilística é deleitante e eloquente, visivelmente resultante de uma inteligência que tem noções claras de como a operação em estúdio deve decorrer – e de como se devem atingir os objectivos. Bjørn Torske tem finalmente mérito próprio, soube decompor a matéria e teve tempo para a digerir. Transmite uma sensação de ingenuidade mas sabe bem que aí reside a mais-valia de um som que vê uma série de partículas assentarem no sítio certo. O espectro de Feil Knapp é integro e de muito bom gosto.


MÚSICA SOUL NASCIDA NA ALEMANHA: VERDADEIRAS SESSÕES COM ALMA

A velha retórica filosófica poderá definir a alma como algo imaterial, inexistente para além de uma auto-consciência de valores éticos e morais erguidos por religiões impregnadas por paradigmas de orientação espiritual. E se enquanto vivos acreditamos que temos uma alma capaz de despoletar emoções e competente para distinguir o bem do mal, já haverá dúvidas sobre que caminho toma a mesma depois da morte. As religiões não se poupam a certezas. As doutrinas de cada uma assim o provam. A ciência dúvida. As filosofias especulam. No fim, o homem acreditará no que quiser, apesar das religiões serem as que melhor conseguem “materializar” o ser e a sua essência num “pacote” único.

O homem saberá melhor que ninguém a necessidade de exteriorizar emoções. A angústia tem e sempre teve um aperto singular na expressão da alma. No caso da música soul, e em especifico o embrião que foi o gospel, a manifestação religiosa tomou as rédias de uma expressividade individual que mais tarde se foi politizando. Da raiva, do amor, da necessidade de liberdade até a uma afirmação racial de princípios próprios, a música, que começou por ser entoada em campos de trabalho e depois generalizada em encontros religiosos, tornou-se no veículo por excelência de verbalização de revoltas individuais, de denúncias de opressão.

É historicamente inegável que muita da música contemporânea tenha nascido num caldeirão afro-americano onde o confronto descarado entre a angústia e uma alegre liberdade espiritual tenha sido o principal motor para a erecção de paradigmas fundamentais que ainda hoje subsistem na nesta cultura multiracial. Da interpretação da bíblia às primeiras entoações religiosas em vozearia black gospel music, das praise songs aos acordes blue note que inspiraram os blues, do ragtime do final do século XIX ao jazz, da miscelânea rhythm and blues às primeiras harmonias rock, do funk ao hip-hop, a matriz sonora afro-americana cresceu e evoluiu para além do bundo que dominava as choças da escravatura para um conjunto de linguagens suburbanas – hoje completamente refinadas.

A alma tomou forma como música bem para além das velhas teorias filosóficas. Ela tornou-se viva, consciente e material através de acordes instrumentais e vocalizações. Aliás é na voz que a alma se expressa. É a voz que formaliza o conceito soul, que constrói uma identidade estética que dá forma a emoções ora alegres ora tristes. É nela que se tornam transparentes alguns costumes seculares: a tradição religiosa e o respeito pelo núcleo familiar.

Com o evoluir das ultimas décadas, a música soul foi se caracterizado. De Sam Cooke a Ray Charles, de Little Richard a James Brown, da Stax Records – onde militaram Otis Redding ou Isaac Hayes – à concorrente Motown – onde cresceram vozes singulares como Marvin Gaye, as Supremes, os Temptations ou os Jackson 5 – a soul music cresceu e deu ao mundo alguma das mais tocantes músicas, algumas mesmo intemporais, sugerindo todas elas uma certa sensação de alívio e um prazer espiritual capaz de devolver luz às trevas.

Além de um evidente negócio para muitas corporações, há ainda alma na música soul, ainda há um coração que bate para além dos lucros. Mas mais importante, e talvez muito ignorado nos últimos anos, ainda existe uma capacidade de distanciar-se dos piores exemplos estilísticos do r&b – para não falar de uma propositada intenção das majors em confundir a música soul tradicional com a tradição mais abrangente de um r&b aberto aos mais disparatados estímulos. A música soul de cariz tradicional tem tido a sua evolução natural, a instrumentalização tornou-se mais eloquente, as electrónicas fizeram-se sentir. Mas se o termo tradicional se poderá aplicar mais a um tipo de escrita, a tradição também poderá ser posta à prova com a introdução de ideias capazes de estimular a criatividade dos seus autores, bem como entusiasmar quem aprecia um género que se estima pelo aparente conservadorismo da sua ideologia.

Apesar de nos últimos anos a soul andar perdida num labirinto criado pelo r&b brejeiro de Hollywood e por vezes ser refém de uma determinada imagem criada pela MTV, ainda surgem nomes fora do típico circuito – femininos, no caso que este artigo apresenta – interessantes o suficiente que, sem estarem presos ao eterno filão da Motown, da Stax ou Fame, criam com os mesmos sentimentos que moveram Gladys Knight, Aretha Franklin ou Carla Thomas e, numa aparente comunidade virtual, comungam interesses com vozes contemporâneas como Jill Scott, Erykah Badu, India.Arie, Meshell Ndegeocello.

Ayo e Joy Denalane são jovens e nasceram na Alemanha. Ambas vêm o mundo à sua maneira. São duas formas de interpretação. Dois tipos de formalidade soul em que ambas prestam homenagem aos clássicos e simultaneamente abrem a porta para um abrangência estilística que enriquece o cânone da soul no mundo. Eis os mais interessantes registos soul dos últimos tempos.


Ayo
Joyful

Nascida na Alemanha, criada por pai nigeriano e mãe romena, Joy Olasunmibo Ogunmakin apresentou-se ao mundo em 2006 como Ayo. Joyful é o primeiro resumo de um percurso que também passou por Paris. E não sendo um perfeito exemplo sonoro que tenha captado a música do mundo é um facto incontornável que a música de Joyful transborda algumas das mais belas influências da soul clássica norte-americana sem nunca negar as raízes da sua autora. Não influi, nem se deixa contaminar pelas referências mais óbvias da soul, folk ou do reggae. Também não é a típica soul que a América nos tem habituado. É apenas a música que a sua autora queria que fosse: a vocalização dos seus desejos, dos seus medos, dos seus amores. E escreve por respeito ao legado familiar e pela deferência a Deus. Tudo vai acontecendo de forma normal e até inocente. Evoluindo espontaneamente por entre acordes de guitarra em tom folk e precursões elementares com o cheiro da terra africana nos pés. Joyful soa falsamente rústico. Revela uma invulgar eloquência na composição. É solarengo, quente, húmido. É afectuoso sem incomodar com abraços complacentes mas obsequioso na forma como envia a sua mensagem à alma humana.




Joy Denalane
Born & Raised

Sentido ainda um certo complexo pela forma como cresceu na cidade de Berlim, como foi educada por pais de origem sul-africana e como a soul a influenciou como pessoa, ao segundo disco Joy Denalane revela-se finalmente ao mundo. Depois de Mamani de 2002, Born & Raised confirma as ideias e propósitos que levaram Denalane a decidir-se pela música a tempo inteiro: a necessidade de comunicar, de explorar a luz da verdade, de rogar a Deus e agradecer pela pessoa que em se tornou.
Produzido em Filadélfia, a soul de Born & Raised é na maioria das vezes genuína e séria. O hip-hop estabelece a cadência e a inspiração no gospel domina a acção sem embaçar desnecessáriamente o pretendido. A voz denota uma certeza profissional e profícua na comunicação com outros espíritos. Este segundo registo da alemã não será radicalmente diferente dos propósitos neo soul que trouxeram ao mundo discos como Who Is Jill Scott? Words and Sounds Vol. 1 de Jill Scott, Mama's Gun de Erykah Badu ou My Life de Mary J. Blige (do qual é fã assumida).
A colaboração com Lupe Fiasco ou Raekwon não é uma inocente mais-valia que mostre um distanciamento da neo soul tipificada na América. Born & Raised ganha quando pensa e fala por si ou se deixa contagiar pela escola soul de 60; quando se inspira na vida de Joy Denalane e se torna um registo algures entre o biográfico e a observação do quotidiano. Mas também perde um pouco do que poderia ter sido quando se distrai em alguns maneirismos r&b. Nada que a simpatia que derrama não faça esquecer num ápice
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Tuesday, November 6, 2007
 
COMMON
Finding Forever

Do título podemos já extrair a primeira ideia: Common procura a eternidade. Mais, procura inscrever o seu nome nos anais da história. Talvez assim se comece a perceber a ambição do rapper. Não será o primeiro a ter essa ambição, nem será o último. E não fosse Be, de 2005, provavelmente o rapper de 35 anos teria editado agora o seu melhor disco. Teria o derradeiro momento de glória que o projectaria para um nível de realização pessoal muito para além do que qualquer um de nós poderia sequer imaginar. Mas Be foi o verdadeiro momento de viragem tanto na forma de abordagem sonora, como da própria mutação da personalidade de Common.
O disco de 2005 foi o obvio resultado de uma introspecção pessoal. De uma deslocação de uma determinada postura mais rebelde para uma atitude adulta e responsável. Uma atitude que questiona a alma, que acredita na realidade, mas que desconfia de boa parte dos paradigmas da sociedade. No fundo, Be foi a consequência de Common ter tocado em Deus. De ter visto uma luz potenciadora de clarividência. Resultado da abertura de uma alma para um mundo de paradoxos, mas também a percepção de uma esperança suficientemente revigorante para alimento espiritual.
Finding Forever não será mais que uma consequência natural de Be. Um novo capítulo de mesmo livro. O novo disco não é uma continuação óbvia, mas também não será a revelação que foi disco anterior. Finding Forever será quase uma analogia contemporânea ao clássico The City on The Edge of Forever. Um desenvolvimento dramático onde o hip-hop, a soul, o gospel e o r&b são chamados ao cenário e forçados a interagir, onde consciências são alertadas e mentes chamadas à atenção para o perigo do desaparecimento de uma linearidade familiar.
Entre a revolta interior, a alquimia que permite melancolia e a alegria, retratos urbanos, banalidades sociais e a necessidade da inspiração religiosa, Common volta a ser certeiro na proverbial expressão dos seus sentimentos. Uma vez mais Kanye West serve de base para uma produção imaculada, não muito aventureira mas proficiente o suficiente para que a alma se expresse com eficiência. “Start The Show” e “Forever Begins” são prova disso mesmo quando de uma forma quase sublime nos encantam com uma linguagem hip hop e soul muito acima da mediocridade que reina no meio. Talvez a própria distancia entre Detroit e Hollywood seja um factor essencial para que não haja contágios com o burlesco que a industria manipula.
Calmo, sereno e sério são posturas que Common assume uma vez mais. São estados de alma que se encontram, são hipocrisias que se apontam. Finding Forever seria uma obra-prima da soul, um objecto de idolatria garantida. Tudo se Be não tivesse nascido primeiro. Tirando esse facto incontornável, não poderíamos esperar melhor num ano parco em boa música afro-americana. Curiosamente, o novo disco de Kanye West também já está por aí. Será desta que os percursos de dois mestres do hip-hop se tornão paralelos? A ver vamos. Garantido é que Finding Forever é um bom disco. Se será o derradeiro momento de glória, isso só o futuro dirá.


EBB
LOONA

Como diria Ebb: “The north of Sweden is during winter, very cold and snowy, and there are never-ending forests and wide horizons”. Não será um mero acaso da Natureza a urgência que alguns músicos e produtores do norte da Europa encontram na elaboração de retratos da terra natal em confronto directo com uma linguagem electro-acustica descongeladora de sentimentos variados. Ora venham da Islândia uns Sigur Rós ou Múm, da Noruega Erlend Oye ou uns Royksopp e agora da Suécia um Ebb, parece existir uma partilha inconsciente de ideias numa comunidade de músicos habituada ao frio polar.
Tendo crescido em Luleå no extremo norte sueco, Ebb habituou-se ao pacífico estado de alma que a natureza local lhe incutiu na personalidade. E mesmo tendo decidido deslocar-se para a cidade, o profundo contacto que sempre teve com a terra natal não se lhe obliterou da memória. E Loona é prova disso. Entre as pulsações nervosas de uma electrónica irrequieta e a calmaria poética que as suas melodias invocam, nasce um contraste evidente entre os sonhos inocentes de uma criança envolta pelo denso verde de uma floresta enevoada e a fadiga nerval que acelera o metabolismo e explora desnecessariamente o limite da tensão humana.
E será uma vez mais essa resistência que expõe o melhor de dois mundos a mais-valia que torna Ebb num músico de ideias respeitáveis no universo da folktronica. O tema de abertura – e que dá título ao disco – é um dos soberbos momentos que reflecte para o resto da música o espírito que poderemos encontrar ao longo de uma hora: uma formalidade pop que se solta com estalidos e bleeps em tom experimental. A eloquência da composição assegura-nos a integridade. A electrónica auxilia a aventura fazendo com que a máquina pulse vida sem que se olhe para ela como um biónico com excesso de programação.
O tom melancólico de “Loona” e “When Dusk Begins” relembra a outrora perfeição etérea que Sigur Rós perderam. Em “I Am All Made Of Music” os Royksopp são chamados à memória quando a interface entre a noção de melodia perfeita e o equilíbrio das electrónicas elegantes é necessário para sustentar a ideia prima. Já “Minau” vive suspenso entre as hesitações atmosféricas dos Múm e as certezas rítmicas de Four Tet. As aproximações a uns Kings Of Convenience também não passarão despercebidas, tanto que a necessidade de expor emoções não difere substancialmente, independentemente da impressão menos acústica ou mais electrónica de Ebb.
Não viveremos em Loona o absoluto reconhecimento de um novo mundo, agora já podemos viver na necessidade de descobrir, quanto antes, um disco pop que agradará a quem encontrou nos Junior Boys o ideal de canção perfeita. Frio por fora e quente por dentro, Loona reconforta-nos com a sua delicadeza natural, embala-nos a alma com a sua monção poética e derrete o gelo sem grandes contrariedades. Nem se esperaria mais em tempos de aquecimento global.


Belleruche
Turntable Soul Music
Quando algumas fórmulas se repetem em loop numa tentativa desesperada para colocar em primeiro plano ideias que só por si têm alguma dificuldade em sustentarem-se pelo próprio pé e a tudo juntam uma voz em pura revelação, existe na génese uma deficiência reveladora de pobreza de concepção que nem faz brilhar uma voz esforçada nem procura a eloquência de um groove perfeito. E fazer com que tudo soe a velho poderá também não ser a melhor forma de convencer quem, à primeira, desconfia dos propósitos da operação Belleruche comandada pelo guitarrista Ricky Fabulous e pelo modesto DJ Modest.
Seja pela ideia quase básica de um turntablism inspirado pelo jazz, pelo funk ou pelos blues, as especulações entorpecidas em torno de um trip-hop esquecido ou a invocação da recente memória de um Mr Scruff em dias dourados, a retórica de Turntable Soul Music não passa de mais um argumento inválido que envoca a memória do cânon soul e blues resguardado pelo hip-hop. Por outras palavras, aqui não há nada que uns Break Reform já não tenham tentado, por mais que uma vez, impingir – com um pouco mais de sabedoria – aos mais impetuosos consumidores de soul com traços europeus. Muito menos existe uma vontade de quebrar paradigmas instalados – no mínimo à 10 anos – pelo catálogo da Ninja Tune.
Em Turntable Soul Music os ritmos circulam instintivamente em loop, os samplers jazz rebuscados ajustam-se cautelosamente a uma voz que talvez seja a única mais valia que por aqui se ouve. Kathrin deBoer, inspirada por algumas das divas intemporais como Nina Simone, Billie Holiday, Sarah Vaughan ou até mesmo Eryka Badu, ensaia – ou pelo menos tenta – varias visões sobre a matéria por elas deixadas como legado e recontextualiza – uma vez mais – num tom melancólico todo mundo urbano refém da sua própria arrogância claustrofóbica ou cinzentismo abstracto.
Para além dos raros momentos em que Kathrin salva alguns exercícios preguiçosos do colapso absoluto – “Reflection”, “Balance” e “13.6.35” são os momentos espiritualmente mais coloridos – não haverá muito mais a esperar de um disco estafado ideologicamente à nascença. Não que o género esteja longe de potenciar novas revelações, apenas há ideias que necessitam de séria estruturação e não apenas de mera aglomeração de referências moídas pelo tempo em que estiveram expostas ao mercado sôfrego. Por isso exige-se actualmente mais espírito para dar cheiro novo ao velho e não apenas naftalina para disfarçar o mofo.


MAP OF AFRICA
Um paradoxo dos nossos tempos. Dois senhores da música de dança criam um disco rock fora de tempo, confuso mas agradavel. O que virá a seguir?
Poderia supor-se pelo título que se trata de uma viagem ao coração de África. Poderíamos supor que através dos “mapas” redescobrir-se-ia a centelha ignescente de toda a música popular contemporânea. Que estaríamos perante um dos raros momentos de reflexão cultural onde revelar-se-iam os antípodas ancestrais. Pois se pensavam, enganem-se.
Perante o verdadeiro impasse criativo que esta época está proporcionar, a ausência de rumo definido poderá não só significar – e justificar – o amalgamar sem prumo de referencias passadas, como desviar a riqueza estética de outrora numa tentativa de recuperação desesperada de um virtuosismo desaparecido como se de uma arca perdida se tratasse. E se não chegasse meia dúzia de anos do novo século para o provar, há quem não desista da subsistência seja pelo meio que for. Os diversos oportunismos – alguns positivos, outros negativos – têm não só confundido o trajecto para o futuro, como têm traído quem já tinha a certeza do que não queria.
E onde se encaixa o projecto destes manifestos militantes da actual música de dança? O que realmente pensar da ousadia de Harvey Basset e Thomas Bullock num período que parece revelar alguma revitalização da dance scene? Talvez nada. Talvez mereça a oportunidade do ouvinte que, ignorando as diversas referências que vão desde os Pink Floyd, Dire Straits ou mesmo LCD Soundsystem, encare a peça Map Of Africa como um velho desejo tornado realidade. Ou sinta a poderosa vontade de uma dupla em desdobrar-se em esforços e compor um disco rock com um falso espírito épico. Ou encare ainda isto apenas como um disco onde a música extravaza o prazer que deu em ser elaborado.
Paradoxalmente, o disco está desfasado do seu tempo e no entanto reside aí o prazer de ouvir uma música sem compromissos de futuro. O registo é linear no pensamento que sustenta, numa certa rebeldia contida, descaradamente oportunista – talvez positivo – no tempo em que vê a luz do dia. No entanto para Harvey e Bullock não será a fama ou o dinheiro o motivo para a encarnação nesta forma de estar. Talvez garanta a subsistência ou talvez se trate de uma estranha cruzada em busca da felicidade. Agora certo é que não se trata de um achado milagroso que seja um fiel retrato da cultura musical dos nossos dias. E se a dupla confunde o ouvinte com um título sem uma aparente razão de ser ou com uma capa misteriosa, fará as delícias de quem, por pequenos momentos, deseje esquecer os últimos 25 anos da música contemporânea. Confuso mas aprazível.


Eles não se preocupam com a idade. Mas preocupam-se com a qualidade soul que trouxeram ao mundo. Nós agradecemos.

Em 1997, ano oficial da fundação, a Sonar Kollektiv começou por ser uma super-estrutura organizada pelos Jazzanova de promoção não só de música, mas também de arte urbana em geral (intercambio de músicos e DJ's, design variado, organização de eventos de arte plástica, grafitis, entre outras expressões de rua) em conjunto com uma série de outros amigos-colaboradores. Na altura, a Sonar Kollektiv não era ainda sinónimo de editora de música como hoje conhecemos, mas sim nome empresarial que albergava uma série de micro-editoras (entre elas Airdrops, Best Seven, Dialog Recordings, Mermaid, No Zession Recordings, Recreation Recordings) cada uma delas com autonomia suficiente para contratar e editar nomes conforme os gostos e preferências de quem as geria. Tudo apenas com supervisão criativa de um colectivo de músicos, produtores e Dj: os imergentes Jazzanova.

A primeira micro-label a estrear-se foi a Airdrops onde revelar-se-iam Meitz e RAS. Seguiu-se a Dialog com os primeiros trabalhos dos Extended Spirit (núcleo criativo dos Jazzanova), a Mermaid onde se revelariam os Slope, a No Zession onde militariam os Micatone ou, a ainda activa, Best Seven que nos agraciou com nomes como Lightning Head de Glyn "Bigga" Bush (ex-Rockers Hi-Fi) ou Joe Dukie & Dj Fitchie (a fase embrionária dos Fat Freddys Drop).

As atenções de DJ's (uns menos outros mais profissionais, como por exemplo Gilles Peterson) e do público em geral acabaram por ser atraídas, não só pelas edições cada vez mais regulares de 12” ou EP, mas naturalmente pelas antologias de qualidade, umas mais temáticas que outras, como Off Limits de Dixon, as Dub Infusions de Daniel Haaksman, In Sessions de Stefan Rogall, Best Seven Selection de Daniel Best e, naturalmente as colectâneas organizadas pelos próprios Jazzanova. Era evidente que um conjunto tão disperso de ideias, de projectos criativos, de etiquetas, produtores e DJ’s estariam sujeitos a perderem-se no tempo e no espaço se a Sonar não fosse alvo de uma reestruturação, tanto da sua organização funcional como da imagem transmitida para o exterior.

Em 2003 essa reformulação acabou por acontecer, tendo sido extintas todas as micro-editoras que orbitavam em torno do mesmo logótipo. Toda a estrutura passou então a designar-se apenas de Sonar Kollektiv e todas as edições, fossem da responsabilidade de quem fosse, passariam a ter uma única marca registada. A primeira edição Sonar data-se de Março de 2003, tendo sido editado na altura o segundo volume da colectânea, desta vez organizada por Dixon, com o nome da editora: Sonar Kollektiv. Nomes que haviam feito a casa nos primeiros anos, juntavam-se no mesmo registo como sinal evidente de uma união de facto que haveria de sobreviver até aos nossos dias.

Muitos nomes passaram pelo catálogo da SK, uns ficaram e fazem hoje em dia parte da mobília da casa (Slope, Jazzanova, Micatone, Georg Levin, Clara Hill) outros iniciaram-se e partiram para outras aventuras sonoras (Forss, Deyampert, Future Beat Investigators, Sygaire) outros encontraram momentaneamente um escape para, dissimuladamente, editar outras formas de música (Moonstarr, SoulPhiction, Benny Sings, Henrik Schwarz). E é tal a abrangência da música editada que muito provavelmente o espectro sonoro continuará a alargar-se no futuro. Prova disso foi o recente apadrinhamento das primeiras excursões da Innervision ou as actuais apostas no reggae com projectos desconhecidos como os neo-zelandeses The Black Seeds ou a alemã Eva Be.

Chegados às comemorações do 10º aniversário da Sonar Kollektiv, não poderíamos de deixar de ser presenteados com mais uma antologia. Não daquelas que os Jazzanova habitualmente impõem aos consumidores habituais de colectâneas. É, sim, uma colectânea/retrospectiva do catálogo de uma das mais influentes editoras europeias: uma mega colectânea de dois CD’s que não se inibe de contar a história quase – mesmo quase – minuciosamente.


V/A- Sonar Kollektiv
10 Years, Who Cares?

Certamente que não poderemos deixar de acreditar que ao longo de 31 faixas estarão representados alguns dos mais importantes clássicos da editora de Berlim. Sim, que a presença dos Extended Spirits e dos Jazzanova é inevitável, tal como a presença de Joe Dukie & DJ Fitchie com o fabuloso “Midnight Marauders”, Nuspirit Helsinki com “Seis Por Ocho” revisto pelos brasileiros Azymuth, RAS e o seu “Beat De La Romantique”, Forss e a estranha produção “Using Splashes”, Lightning Head com “Me & Me Princess”, Soul Quality Quartet e “I’m Not Here” ou dos Fat Freddys Drop, maravilhosamente revistos pelos Jazzanova. Curiosamente todos estes temas estão inseridos no primeiro disco (compilado pelos Jazzanova), tendo sido transferidos para o segundo CD, alguns dos mais desinteressantes temas. Vale-nos a perícia na arte da mistura do colectivo de Berlim para – parcialmente – salvar segundo disco de alguma monotonia estética. Porque com excepção dos curiosos Kabuki, Tokyo Black Star ou Moonstarr, os restantes ou estão entre o inoportuno, o inconsequente ou a pura perda de tempo.

Se é variedade através da abrangência que procuram, não faltaram momentos no próprio percurso da editora que proporcionem essa mesma diversidade. Ficará então por explicar a necessidade da inclusão de nomes que pouco têm contribuído para a credibilidade sonora da casa. Não será naturalmente necessário relembrar que não existem catálogos perfeitos, mas já será necessário salientar a inoportuna inclusão num quase desnecessário mix CD de temas ou nomes como Georg Levin (que fazendo parte à longos anos do catalogo, ainda não conseguiu impor-se como artista em pleno criativo), as desinteressantes revisões dos Wahoo de temas dos Jazzanova e os Solar System, Slope e o entediante "Komputa Groove" (o já habitual enche-lata da Sonar), os pouco relevantes Isoul8 ou Âme, a praxe de uma Tiger Stripes Remix para um original de Markus Enochson ou os já esquecidos Sequel.

O primeiro disco é praticamente imaculado, representando realmente o melhor que a SK trouxe ao mundo. Agora o segundo beneficiaria de uma selecção mais eclética por parte dos Jazzanova. De uma selecção que privilegiasse temas dos primórdios das micro-editoras da Sonar. Temas igualmente pertinentes numa revisão de catálogo. Em vez do indispensável, temos por vezes a sensação que o segundo disco é um elemento desnecessário que soa a um empilhamento de nomes com pouca pertinência no catálogo da Sonar Kollektiv. Não será grave, nem será completamente inútil, agora não se poderá deixar de apontar o dedo a uma selecção que começa por apresentar os diamantes mais vistosos e valiosos – abdicando de discretas pérolas que uma vez mais ficaram esquecidas no baú –, privilegiando depois o lado menos positivo da história.
Who Cares? We do!

Sonar Kollektiv: Discos essenciais

Extended Spirit - Solid Water (1999)(Dialog Recordings)
V/A - Off Limits (1999) (Recreation Recordings)
V/A - Dub Infusions 1989-1999 (2000) (Best Seven Recordings)
V/A - Sonar Kollektiv (200) (Dialog Recordings)
Micatone - Nine Songs (2001)(No Zession Recordings)
Reunion - Re: (2002)(Dialog Recordings)
RAS - Rhythmic Altered State (2002) (Best Seven Recordings)
Micatone - Is You Is (2003)
Forss - Soulhack (2003)
Deyampert - Shapes & Colors (2003)
Umod - Enter The Umod (2004)
Fat Freddy's Drop - Based On A True Story (2005) (Edição exclusiva para alguns paises europeus)
V/A Jazzanova: The Remixes 2002-2005 (2005)
Soulphiction - State Of Euphoria (2006)

Sonar My Sapce:
http://www.myspace.com/sonarkollektiv


ARTIGO PUBLICADO ORIGINALMENTE NO BODYSPACE


THE CHEMICAL BROTHERS
WE ARE THE NIGHT

Poucos aguardarão com anseio um novo disco dos Chemical Brothers. Poucos escutarão o disco por completo. Mas muitos prestarão atenção aos temas mais orelhudos. A explicação será fácil e nem a desastrada lei de Murphy conseguirá perverter a lógica simplista de um projecto que, com mais de 10 anos de actividade, sabe que a melhor maneira de sobreviver num mercado de consumo rápido é se souber estruturar meia dúzia de temas e pelo meio colocar material inconsequente que preencherá o resto do disco. E não há dúvidas que Tom Rowlands e Ed Simons conhecem como poucos os mecanismos que fazem render a sua música e perpetuar a carreira.
Não são – nem nunca foram – um projecto capaz de erguer matéria com envergadura estética suficiente e retumbante que permitisse classifica-los como projecto essencial da pop contemporânea. No entanto, e de forma quase paradoxal, não há um único disco editado que não tenha chamado a atenção da imprensa especializada ou que não tenha atraído mais um punhado de fãs para uma causa que se julgava perdida. A forma como, ciclicamente, os Chemical Brothers baralham e voltam a dar é admirável. Não só produzem mais um disco inconsequente, como sem evoluir esteticamente um único milímetro, conseguem entregar à humanidade mais um monumento hedonista onde o corpo ávido de prazer, obriga a mente a ignorar os reais propósitos de uma música saltitona, cheia de ritmos pujantes e melodias que lembram-sempre-qualquer-coisa-mas-que-não-se-sabe-o-quê.
E entre esse pingue-pongue de boas músicas – que quase sempre são os singles – e um punhado de temas que para sempre serão ignorados que os Chemical Brothers provam que nem sempre o mais importante na música de dança é a inovação ou a criação de factos estéticos. We Are The Night poderia supor que estaríamos finalmente perante uma verdadeira ode à vida nocturna segundo a dupla. Mas a expectativa é rapidamente gorada pelos habituais encantos psicadélicos que tanto caracterizou Push The Button, Surrender ou Dig Your Own Hole. O fascínio pelos concertos rock, a insistência no big-beat, a aposta numa techno-house recheada de melodias pseudo-pop ou a acidez usual dos químicos adicionados não serão novidade por estas paragens.
O paradoxo persiste e os Chemical Brothers fazem questão que nada mude no paradigma do seu projecto. E enquanto assim for, haverá sempre alguma curiosidade em torno de Tom Rowlands e Ed Simons, que sendo uma grande banda de singles, ainda não consegui trazer ao mundo um disco que os confirme como grande banda de álbuns. De boa verdade se diga, se tivessem produzido um único grande disco, provavelmente já teriam desaparecido de cena. Assim, mantêm uma linha estética coerente através uma produção competente que, não abalando as fundações do universo, mantém-no unido. Afinal de contas foi esta a profissão que decidiram exercer, como tal proficiência é essencial.


JUSTICE
" † "
Não serão desprovidas de sentido as comparações dos Justice aos Daft Punk. Nem que esta dupla francesa soube, à sua própria maneira, fazer a síntese dos três álbuns originais de Thomas Bangalter e Guy-Manuel de Homem-Christo. Ou que sejam considerados os filhos legítimos de um french touch da era Homework. Nada poderá ser considerado um disparate se atendermos ao facto que estes dois jovens franceses, os Justice, foram, durante a adolescência, influenciados pelo som house/funk híbrido de uma série de projectos gauleses e que o fascínio pela manipulação filtrada de sons disco lhes tenha ficado gravado no DNA artístico.
Depois de uma série de experiências em EPs e algumas remisturas – entre elas Human After All dos Daft Punk –, chega finalmente o álbum de estreia. Aguardado por uns e olhado com desconfiança por outros, o aglomerado de originais numa única “rodela” é a prova definitiva da capacidade de erguer, de forma conceptual, um registo coerente, onde acima de tudo, um projecto consiga fazer valer os seus propósitos, as suas ideias e traga ao mundo uma mensagem que marque o maior número de espíritos.
Xavier de Rosnay e Gaspard Auge fazem parte de uma nova geração que depois do fascínio pelo house do french touch, encantaram-se pelos revivalismos new-wave e electro-pop e desenvolveram a sua base de trabalho em torno de vários mitos, tendo concentrado energias num rock em espiral visto e revisto à luz das novas electrónicas. Os resultados foram irregulares, mas enquanto alguns morreram no desembarque, outros souberam atravessar o deserto criativo e encontrar um porto seguro onde a sua linguagem singular pudesse sobressair em relação aos demais.
Os enigmáticos Justice atingiram um patamar onde, através da Ed Banger – que desde 2002 é uma das mais activas editoras electro francesas –, ergueram uma sonoridade homogénea onde laivos de rock robustos assentam sobre ritmos funk e melodias disco. Nada de novo, dirão muitos. Mas as pulsações nervosas dos sintetizadores – a lembrar um live rock –, os estranhos encaixes sonoros retro, a pungência da estrutura rítmica e os delírios disco marcaram uma identidade musical que os Justice souberam explorar a seu favor.
Conotados com uma house suja, agreste e ácida, a dupla reúne neste – ou seja lá qual for o nome que queiram dar – um conjunto de temas bem equilibrados onde Homework, Discovery, Human After All e os diversos trabalhos das extintas editoras Rolé e Crydamoure são as melhores referências estéticas. Não abonará muito a favor da criatividade e originalidade, mas a destreza em como pegam no legado dos Daft Punk e o atiram contra a parede é divertido e bem enteretido. Veja-se o caso dos três primeiros temas ("Genesis", "Let There Be Light", "D.A.N.C.E.") para depressa chegar-se a essa conclusão.
A aspiciência da dupla é limitada, mas se o objectivo é trazer à superfície o bom electro/house francês então o objectivo foi concretizado. O disco é festivo e alegre sem que o kitsch disco arruíne o ambiente, é contagiante sem resvalar para o mainstream a que nos habituamos, é provocante pela estranha e bruta sensualidade que emana. não possui o brilhantismo de Homework, mas por perplexo que possa parecer, os Justice possuem agora o que os Daft Punk perderam se não tivessem feito um terceiro disco por frete.





MATTHEW DEAR
ASA BREED

Matthew Dear tem feito da quebra de paradigmas o seu principal objectivo enquanto produtor. Seja através da escrita em nome próprio ou encapuçado de Jabberjaw, False ou o mais mediático Audion. Será dos poucos que tem uma visão própria do que um techno inspirado pode fazer pelas linguagens electrónicas mais despojadas. Retirando a faceta mais imediata de um techno funcional e desenhado para as pistas, Matthew disponibiliza-se como poucos neste Asa Breed a actualizar a visão modernista dos princípios que regeram a acção pop de Brian Eno, dos Talking Heads, de Beck, de Nick Cave e até mesmo dos legendários Kraftwerk.
Do Michigan chega o perfeito exemplo da extraordinária capacidade de estruturar pequenas canções pop – algumas a sonhar com o Verão – e simultaneamente promover o lado mais hedonista da música. No início Dear propõe-se a desbravar os ideais tech-house que orientaram a música nos dois primeiros discos – especialmente Backstroke (2004) – para depois dedicar-se à eloquência de uma tech-folk camuflada, quente e inspirada. E à medida que caminhamos para o fim perdemos um pouco a noção do papel que o techno ou o house desempenham. Mas no gume entre a especulação da gramática pop, o experimentalismo high-tech – umas vezes iluminado, outras soturno – e o prazer de fazer boa música, encontra-se a mais-valia que realmente trás ao mundo um facto estético capaz de devolver clarividência à humanidade. Uma das poucas maravilhas de 2007.
 



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    Aristótles


    "De todas as artes que conseguem crescer no solo de uma dada cultura, a música é a última das plantas a germinar, talvez porque é a mais interiorizada, e, por conseguinte, aquela cuja época vem mais tarde é o Outono e a desfloração dessa cultura. A alma da Idade Média cristã encontrou a sua expressão mais acabada na arte dos mestres holandeses: a arquitectura musical por eles elaborada é a irmã póstuma, não obstante legí­tima e igual em direitos, da arte gótica. Foi na música de Haendel que tomou forma musical aquilo que de melhor havia na alma de Lutero e dos seus, esse acento judaico-hebráico que deu á Reforma um certo ar de grandeza: o Antigo Testamento faz música, o novo não. Mozart, o primeiro, restituiu em metal soante todas as aquisições do século de Luí­s XIV e a arte de um Racine e de um Claude Lorrain. Há na música de Beethoven e de Rossini que a melodiosamente respira o século de XVIII, o século do devaneio, do ideal destruído, da fugaz felicidade. Toda a verdadeira música, toda a música original, é um canto do cisne. Talvez a nossa música moderna, seja qual for o seu império, e a sua tirania, tenha diante de si apenas um curto espaço de tempo, porque surgiu de uma cultura cujo solo minado rapidamente se afunda, de uma cultura que em breve será¡ absorvida."
    Friedrich Nietzsche In Nietzsche Contra Wagner.


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